As silhuetas dos barcos rabelos estacionados nas margens do Douro junto à Régua, a Vila Nova de Gaia ou ao Porto parecem hoje vultos condenados a servir de adorno aos bilhetes-postais com que as empresas do vinho do Porto pretendem preservar a memória de um tempo que já não existe.
Rabelo (selecionar as imagens à esquerda do texto)
Há mais de meio século que essas silhuetas traçadas pela vela quadrangular e o enorme leme que, por se parecer a um longo rabo, lhes deu o nome deixaram de ser úteis na faina fluvial. O caminho-de-ferro retirou-lhes protagonismo e o macadame que permitiu o trânsito dos camiões cisterna carregados de vinho do Douro para as caves ditou-lhes a sorte. Mais tarde, as barragens confirmaram-lhes o destino.
Os barcos rabelos estão hoje condenados ao simbolismo de um vale, de um rio e de duas cidades junto ao mar que há mais de 400 anos devotam o essencial da sua existência à produção e exportação do vinho. Por isso, em tempo de vindimas, neste ano de efeméride — a última navegação de rabelos aconteceu em 1964, há 50 anos, portanto, embora haja quem note que terá sido em 1965 —, vale a pena retomar a Memória do rio (título de uma obra referencial dos historiadores Gaspar Martins Pereira e Amândio Morais Barros) e verificar como, ainda hoje, a saga dos rabelos persiste na cultura do Douro.